Acordo de delação de Delcídio provoca terremoto político. Em depoimento à procuradoria-geral da República, ele acusou Dilma e o ex-presidente Lula de proteger o esquema de corrupção
A política brasileira sofreu, nesta quinta-feira (3), um terremoto, com a revelação do conteúdo do depoimento do senador Delcídio do Amaral à procuradoria-geral da República num acordo de delação premiada. Entre outras coisas, o senador afastado do PT acusou a presidente Dilma e o ex-presidente Lula de tentarem interferir nas investigações da Lava Jato. Na reportagem de capa, a revista IstoÉ revela que o senador Delcídio do Amaral, suspenso do PT, fez um acordo de delação premiada com a procuradoria-geral da República. Nos depoimentos, Delcídio faz acusações contra o ex-presidente Lula e contra a presidente Dilma Rousseff. O jornal O Globo publicou há quase duas semanas a notícia de que Delcídio tinha assinado o acordo no dia em que foi solto, sem no entanto, revelar o conteúdo dos depoimentos. A TV Globo também confirmou nesta quinta-feira (3) que Delcídio e o Ministério Público Federal assinaram um acordo de delação premiada. A revista dá detalhes das acusações que envolvem a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, ambos do PT. São 400 páginas de depoimentos, segundo a revista. Delcídio do Amaral acusa a presidente Dilma Rousseff de interferir nas investigações da Lava Jato em três ocasiões e com a ajuda do então ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. De acordo com a revista, Delcídio disse que "é indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro Cardozo e da própria presidente no sentido de promover a soltura de réus presos na operação”. Segundo a reportagem, Delcídio disse que a primeira investida do Planalto para tentar alterar os rumos da Lava Jato foi o encontro realizado no dia 7 de julho do ano passado entre Dilma, Cardozo e o presidente do STF, Ricardo Levandowski, numa reunião em Portugal. Segundo a reportagem, contudo, a reunião foi um fracasso em função do posicionamento retilíneo do ministro Lewandowski, ao afirmar que não se envolveria. A solução então, segundo Delcidio, passava pela nomeação do desembargador Marcelo Navarro para o STJ, Superior Tribunal de Justiça. Tal nomeação seria relevante para o governo, pois o nomeado cuidaria dos recursos e habeas corpus da Lava Jato no STJ. De acordo com a revista, esta tentativa teve participação direta de Delcídio, que relatou que ele e Dilma conversavam enquanto caminhavam pelos jardins do Alvorada, quando Dilma solicitou a Delcidio que conversasse com Marcelo Navarro para que ele confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo Odebrecht, da construtora Odebrecht, e de Otavio Marques de Azevedo, da Andrade Gutierrez. Conforme acertado com a presidente, diz a reportagem, Delcidio se encontrou com Navarro no próprio Palácio do Planalto, em uma pequena sala de espera, no térreo, o que, segundo o senador, pode ser atestado pelas câmeras de segurança. Na reunião, de acordo com Delcídio, navarro ratificou seu compromisso. Em julgamento de habeas corpus no STJ, Navarro votou pela soltura dos dois executivos. Mas foi voto vencido. Por quatro votos a um, as prisões foram mantidas. Delcídio também cita Dilma quando trata da compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. O negócio gerou prejuízo de US$ 792 milhões, segundo o Tribunal de Contas da União. Segundo a revista, Delcídio contou que como presidente do conselho de administração da Petrobras, Dilma sabia que por trás da compra da refinaria havia um esquema de superfaturamento pra desviar recursos da estatal. E que Delcídio disse que a alegação de Dilma que ignorava o expediente habitualmente usado em contratos desse tipo, alegando desconhecimento de clausula como a put option, absolutamente convencional é, no mínimo, questionável. E que a tramitação do processo de aquisição de Pasadena durou um dia entre a reunião da diretoria executiva e o conselho de administração. De acordo com a reportagem, no anexo 17 da delação, Delcídio é taxativo: “Dilma tinha pleno conhecimento de todo o processo de aquisição da refinaria. A aquisição foi feita com conhecimento de todos, sem exceção”. A versão da presidente era de que ela e os conselheiros do colegiado não tinham conhecimento de cláusulas desfavoráveis a Petrobras. O senador garante que a presidente teve participação efetiva na nomeação de Nestor Cerveró para a diretoria da BR Distribuidora, contrariando o que ela havia afirmado anteriormente. Delcidio fala que "tem conhecimento desta ingerência (de Dilma), tendo em vista que, no dia da aprovação pelo conselho, estava na Bahia e recebeu ligações de Dilma". Segundo Delcídio, a atuação de Dilma foi "decisiva". A presidente ligou para ele duas vezes. Na primeira, a presidente telefonou "perguntando se o Nestor já havia sido convidado para ocupar a diretoria financeira da BR Distribuidora". "Depois, ligou novamente, confirmando a nomeação de Nestor para o referido cargo", o que se concretizou no dia 3 de março de 2008. Cerveró é também delator da Lava Jato e está preso desde janeiro de 2015. A reportagem conta que Delcídio também falou que a CPI dos Bingos teria agido para proteger a presidente Dilma. Disse que "uma das maiores operações de caixa dois para a campanha de Dilma em 2010 foi feita pelo empresário Adir Assad, condenado na Lava Jato". De acordo com Delcídio, "quando o governo percebeu que as várias quebras de sigilo levariam à campanha de Dilma, determinou o encerramento imediato dos trabalhos". A CPI da Petrobras também foi citada na delação, de acordo com a reportagem. Ele contou que Gim Argello, Vital do Rego e os deputados Marco Maia e Fernando Francischini cobravam pedágio para não convocar e evitar maiores investigações contra Léo Pinheiro (da OAS), Júlio Camargo (da Toyo Setal) e Ricardo Pessoa (da UTC). Marcelo Navarro Ribeiro Dantas negou as acusações. Disse que jamais conversou com o senador Delcídio do Amaral sobre as questões apontadas na delação, nem se comprometeu a nada com ele. Afirmou ainda que, como relator de assuntos da Operação Lava Jato, não concedeu nenhum habeas corpus sem que a questão fosse levada ao plenário do Superior Tribunal de Justiça. O presidente do STJ, Francisco Falcão, negou a existência de qualquer articulação junto ao governo para libertar réus da Lava Jato. O deputado Fernando Francischini, do Solidariedade, disse que o senador Delcídio do Amaral usou a delação como vingança, por ele ter apresentado convocações e denúncias contra Delcídio. Francischini disse ainda que não teve qualquer movimentação fiscal ou financeira atípica. Vital do Rego, atual ministro do TCU, disse que quando era presidente da CPI da Petrobras, trabalhou em parceria com os investigadores para esclarecer os fatos. E que repudia as ilações. Nós não conseguimos contato com o ex-senador Gim Argello. O deputado Marco Maia, do PT, disse que não foi investigado pela Lava Jato. Afirmou ainda que, como relator da CPI da Petrobras, pediu o indiciamento de mais de 50 pessoas. E que se a delação de Delcídio realmente existir, terá sido feita com a intenção de desgastar o Partido dos Trabalhadores.
Delcídio teria dito que Lula mandou comprar silêncio do Cerveró
De acordo com a reportagem, Delcídio do Amaral afirmou que ex-presidente Lula "tinha conhecimento do propinoduto instalado na Petrobras e agiu direta e pessoalmente para barrar as investigações, inclusive sendo o mandante de pagamento de dinheiro para tentar comprar o silêncio de testemunhas". Segundo a revista, Delcídio disse que Lula não queria que o ex-diretor da Petrobras mencionasse o esquema do pecuarista José Carlos Bumlai na compra de sondas superfaturadas feitas pela estatal.Delcidio contou, de acordo com a revista, "que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comandou o esquema do pagamento de uma mesada ao ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró para tentar evitar sua delação premiada”. Delcídio foi preso depois de ser gravado pelo filho de Cerveró no que o MP considerou uma tentativa de evitar que esta delação fosse feita. Lula teria pedido "expressamente para que ele ajudasse o amigo e pecuarista José Carlos Bumlai, porque supostamente ele estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor Cerveró". Delcídio contou que aceitou intermediar a operação e que a primeira remessa de R$ 50 mil foi entregue por ele próprio em mãos ao então advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, após receber a quantia do filho de José Carlos Bumlai, Mauricio Bumlai. As entregas de valores à família de Nestor Cerveró se repetiram em outras oportunidades. O total recebido pela família de Cerveró, segundo Delcídio, foi de R$ 250 mil. Segundo Delcidio, "ao contrário do que afirma o ex-presidente, Bumlai goza de total intimidade com ele, representando de certa maneira o papel de conselheiro da família Lula”. Segundo o depoimento, “Bumlai foi o principal responsável pela implantação do Instituto Lula, disponibilizando todo o aparato logístico e financeiro”. “Foi também a pessoa que ficou responsável, em um primeiro momento, pelas obras do sítio de Atibaia, do ex-presidente Lula”, segundo o depoimento mostrado pela revista. Delcídio disse que Bumlai já tinha contratado arquiteto e engenheiro, mas Leo Pinheiro, outro grande amigo do presidente, pessoalmente se dispôs a fazer o serviço através da OAS em um curto espaço de tempo. E ainda há mais denúncias na delação de Delcídio, segundo a revista IstoÉ. Nos depoimentos, o senador disse que o publicitário Marcos Valério, condenado no processo do mensalão, exigiu R$ 220 milhões para se calar na CPI dos Correios sobre o esquema. Delcídio, segundo a IstoÉ, afirma que ele e Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula, tentaram negociar o pagamento, mas que foi o ex-ministro Antonio Palocci quem assumiu a tarefa. Segundo Delcídio, em fevereiro de 2006, ele se reuniu com Okamotto e com o presidente Lula, "sendo que na conversa Delcidio disse expressamente ao presidente: ‘acabei de sair do gabinete daquele que o senhor enviou a Belo Horizonte’. E alertou: ‘corra, presidente. Senão as coisas ficarão piores do que estão’". Ainda de acordo com a reportagem, Delcidio, que foi presidente da CPI dos Correios em 2005, disse ter testemunhado na madrugada do dia 5 de abril de 2006 as tratativas ilícitas para retirada do relatório final da CPI dos nomes de Lula e do filho Fabio em um acordo com a oposição. Delcidio teria afirmado também que a votação do relatório da CPI, que poupou o ex-presidente Lula, foi duvidosa. Assim, segundo a revista, Lula se salvou de um impeachment. As denúncias de Delcidio também chegaram à CPI do Carf, que tentou investigar a venda de medidas provisórias. Delcidio afirmou aos procuradores da Lava Jato que como líder do governo foi pressionado por Lula para que os empresários Mauro Marcondes e Cristina Mautoni não fossem depor na CPI. Ele revelou que o ex-presidente temia que o casal pudesse implicar seus filhos no escândalo. Delcidio disse que "tem conhecimento de que um dos temas que mais aflige o presidente Lula é a CPI do Carf”, o Conselho Administrativos de Recursos Fiscais, que é uma espécie de tribunal administrativo que julga recursos de empresas contra multas da Receita. Delcidio diz que. Por várias vezes o próprio Lula solicitou a ele que agisse para evitar a convocação do casal para depor. Lula alegava que estava muito preocupado com eles, mas, em verdade, Lula estava preocupado com implicações à sua própria família, especialmente os filhos Fabio Luis Lula da Silva e Luiz Claudio Lula da Silva. Em resposta a insistência de Lula, Delcidio, como líder do governo no Senado, mobilizou a base do governo para derrubar os requerimentos de convocação do casal na reunião em novembro de 2015. E segundo a revista, conseguiu barrar a convocação do casal. O Jornal Nacional apurou que o casal chegou a ser convocado, sim. Mas Mauro Marcondes não foi, alegando problemas de saúde. E no caso de Cristina, a data do depoimento não chegou a ser marcada. Os depoimentos de Delcidio do Amaral começaram a ser colhidos na quinta-feira, dia 11 de fevereiro, logo depois do carnaval e se estenderam até domingo, dia 14. Os investigadores esperavam colher mais depoimentos de Delcidio, mas em muitos momentos o clima ficou tenso: o senador resistiu, demonstrou cansaço e impaciência, ameaçou desistir da delação premiada. Por isso, acabou deixando nos procuradores e delegados a impressão de que sabia ainda mais do que já contou. A defesa de Maurício Bumlai disse que não se manifesta sobre vazamentos de uma suposta delação que sequer está confirmada. E que só irá falar depois do acesso oficial ao documento. Paulo Okamotto disse que duvida que o senador tenha feito tais afirmações. E que estes fatos nunca existiram. A assessoria de Antônio Palocci afirmou que os supostos eventos que teriam sido relatados pelo senador Delcídio do Amaral envolvendo o nome dele não correspondem com a verdade. Que os contatos e telefonemas não existiram. E que Palloci jamais tratou com o senador Delcídio do Amaral dos assuntos relatados pela reportagem da revista. As defesas de Marcos Valério, de José Carlos Bumlai e de Léo Pinheiro não quiseram se manifestar. Nós não conseguimos contato com as defesas de Edson Ribeiro, de Nestor Cerveró, de Fernando Baiano, de Mauro Marcondes e de Cristina Mautoni. A assessoria do ex-presidente Lula divulgou uma nota sobre as denúncias. Disse que as acusações contra Lula são completamente falsas. Que o ex-presidente jamais participou, direta ou indiretamente, de qualquer ilegalidade, antes, durante ou depois de seu governo. Por fim, a nota diz que a sociedade brasileira não pode ficar à mercê do que chamou de "jogo de vazamentos ilegais, acusações sem provas e denúncias sem fundamento”. (Fonte - Jornal Nacional)
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